terça-feira, 5 de janeiro de 2010

COMEÇAR O ANO COM UMA UTOPIA - BROADACRE CITY


A Broadacre City surge num contexto muito específico pela mão do arquitecto Frank Lloyd Wright, o que faz com que a proposta apresente características de um determinado contexto cultural e histórico mas que tem certos traços pessoais fruto da postura de Wright.

Para Whight a cidade industrial enredada pela máquina perdeu a sua natureza, a sua lógica interna, a sua essência e arrastou consigo os cidadãos, que prisioneiros do maquinismo infernal perderam as suas referências, acabando por se tornarem marionetas – de produzir, de rentabilizar, de multiplicar. Devido à grande cidade industrial ter abandonado o valor da terra largando no esquecimento o verdadeiro valor do humano. Whight afirma: «a felicidade do cidadão convenientemente “urbanizado” consiste em aglutinar aos uns aos outros dentro da desordem, iludido como é pelo calor hipnótico e pelo contacto forçado com a multidão. A violência e o rumor mecânico da grande cidade agitam a sua cabeça “urbanizada”, enchem os seus ouvidos “urbanizados”. (…) Uma agitação perpétua excita-o, rouba-o à meditação e à reflexão (…) ele torna-se um agente, vendedor de ideias rentáveis, um viajante que explora as fraquezas humanas especulando com as ideias e invenções dos outros um parasita do espírito (…) perpétuo escravo do instinto gregário, (…) submisso um poder estranho».(1)

Whight vê na noção de aluguer um dos principais problemas da cidade, alugam-se habitações e terrenos, em nome da eficácia a cidade é alugada e sujeita à especulação do mercado e ao domínio do senhorio. «Este é um mundo que vive do parasitismo e da exploração; este é o mundo da pobreza de espírito; o reino dos estereótipos e de uma massa de gente desenfreada, “bonecos mecânicos” que se arrastam em rebanho movidos pelo artificialismo e pelo «instinto gregário». (2)

Assim, a Broadacre City nasce da crítica da realidade existente, de uma cidade inadequada, doente, perdida e transforma-se numa das grandes utopias do século XX. Em 1935, Whight apresenta nos E.U.A a maqueta do seu modelo de cidade (fig. Z), o modelo não se destinava a uma determinada área, não tendo um lugar específico, apresenta uma malha uniforme, contínua, que se alastra indeterminadamente, sem fronteiras, a solução absoluta. «A cidade convertida em nação.» (3)

Na Broadacre City é o campo que ganha vida sobre a forma de uma grande cidade, estende-se por todo o território, tornando cada cidadão num urbano e num camponês. A sua forma dispersa revogará qualquer tendência de convergência, que se tornaria numa mistura de funções ou de pessoas apertadas. Segundo Wright «os grandes centros urbanos já não estavam em vias de desaparecimento; eles tinham deixado logo de existir». (4) Numa era onde os meios de comunicação representam um sintoma importante na evolução dos modos de vida, onde a supressão/redução das distâncias constitui-se como um facto adquirido, a tendência à concentração entra necessariamente em decadência.

Assim, Whight cria a cidade do aventureiro, do nómada, a cidade que inspira liberdade, que respira movimento, coberta por um emaranhado de vias, estradas e auto-estradas, de redes de telecomunicações, uma grelha de fluxos, Broadacre City é, neste sentido, uma cidade de comunicação, do movimento, que pela sua grelha cada ponto encontra-se ligado potencialmente a todos os outros.

A natureza, surge na cidade como meio continuo, receptor de todo o sistema, é o principio fundamental e é nela que assentam todos os componentes que trabalham organicamente, garantindo o equilíbrio do Homem consigo mesmo e com os outro da cidade, onde a beleza da paisagem seria procurada como elemento da arquitectura.

Wright quer «resgatar o valor da terra enquanto direito do Homem, ou o do Homem enquanto herança fundamental da terra» (5) Mas, para isso Whight recupera a importância da máquina e das tecnologias, porque só a máquina poderá garantir as condições materiais para uma sociedade verdadeiramente democrática, a utilização da tecnologia poupará a morosidade das tarefas do Homem, oferecendo-lhe uma maior margem de prazeres. As novas tecnologias não são sinónimo de degradação das motivações e tarefas mais belas do ser humano, elas representam dados fundamentais na caracterização da época contemporânea e são os motores essenciais a uma sociedade moderna devendo ser levadas em conta em qualquer sociedade.

Hoje quando falamos em sustentabilidade sabemos que o planeta não é infinito, os territórios não são infinitos, e precisamos de ser mais económicos, a utopia de Wright nunca chegou a ser construída, muito devido à dispersão visto que cada pessoa teria um acre (aproximadamente 4046 m2) de terreno. Lloyd Wright não tinha a preocupação com a economia do território. O que ele tinha, e hoje mantém-se actual, era a necessidade de não estragar a natureza com as marcas do progresso.

Hoje vivemos num contexto de uma forte crise ambiental, que pode ser entendida como uma crise civilizacional. A violência urbana pode ser considerada um dos maiores distúrbios da sociedade actual, as leis são infringidas e perdem-se totalmente as noções de cidadania, base de sustentação para um melhor convívio social. Neste contexto o sistema urbano constitui, o grande desafio do futuro e a sustentabilidade é o objectivo de qualquer formulação que se considere progressista e comprometida com um futuro socialmente solidário e ambientalmente seguro.

As preocupações ambientais e humanas já existem há vários anos, a falta de energia e matéria-prima, o caos urbano, o trânsito e o excesso de calor aceleraram as discussões globais sobre as práticas arquitectónicas, que se vêm na necessidade de apresentarem soluções para os vários problemas que emergem.

Coloquemos os óculos verdes!
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1 in CHOAY, F., O Urbanismo. Utopias e Realidades. Uma Antologia pag. 236
2 in CHOAY, F., O Urbanismo. Utopias e Realidades. Uma Antologia pag. 237
3 in CHOAY, F., O Urbanismo. Utopias e Realidades. Uma Antologia pag. 242
4 in FISHMAN, R., L’Utopie Urbaine au XXe Siècle. Ebenezer Howard. pag. 97
5 in CHOAY, F., O Urbanismo. Utopias e Realidades. Uma Antologia pag. 241

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